Hoje, a posição que anda em voga, é algo do gênero da corruptela Nietzcheana de que “sem música, a vida seria um erroâ€.. mas seria esse o triste fim da filosofia (e da arte)? Ficar confinada de modo irracional, a especulação?
Ao invés de tratar com rigor, como bem expõe L. Ferry no seu livro, HOMO AESTHETICUS – A invenção do gosto na era democrática – que enquanto “para os Antigos, a obra (de arte) é entendida como um microcosmo – o que permite pensar que exista fora dela, no macrocosmo, um critério objetivo (a realidade humana; suas paixões; o sensÃvel), ou melhor, o substancial do Belo -, para os Modernos, a obra só ganha sentido em referência à subjetividade, vindo a se tornar, para os contemporâneos, expressão pura e simples da individualidade: estilo absolutamente singular que não quer ser mais em nada um espelho do mundo, mas sim criação de um mundo, o mundo no interior do qual se move o artista e no qual temos, sem dúvida, permissão para ingressar, mas que de modo algum se impõe a nós como um universo a priori comumâ€.
Não!!! Nós não somos nietzcheanos!!! Tampouco irracionalistas; individualistas egocêntricos que subvertem o caráter concreto e genuÃno da arte. Estamos com Lukács, quando o húngaro diz que “a arte é o modo de manifestação mais adequado e elevado da autoconsciência da humanidadeâ€. Estamos com o filosofo também quando este diz que "a consciência não se encontra fora do desenvolvimento histórico. Então, não tem que esperar que o filósofo a introduza no mundo; razão pela qual o filósofo não tem direito a contemplar orgulhosamente de cima para baixo as pequenas lutas do mundo e depreciá-las".
Ou seja: não estamos aqui como macaca de “cirque di soil†– elitista. Estamos aqui porque acreditamos na vocação pedagógica da arte – de educar as individualidades; a consciência – o(s) sentido(s) humanos – de voltar os sentidos humanos para a realidade (humana) – de compor esses microcosmos que exponham as paixões humanas no seu radical, de forma nevrálgica - que estão expostas e operam com tanta cor na literatura de V. Serge. Segue ele:
“Uma literatura (arte, filosofia, música..)que abordasse os grandes problemas da vida moderna, que se interessasse pelo destino do mundo/.../ que não se contentasse em descrever o mundo, mas pensasse de vez em quando em transforma-lo; que fosse, em suma ativa e não mais passiva, que fizesse apelo a todas as faculdades do homem, respondesse a todas as suas necessidades espirituais, /.../ uma literatura dessa espécie seria, independentemente das intenções dos seus criadores, fortemente revolucionáriaâ€
(Serge)
Estamos aqui para fazer frente, (van)guarda, entrar em contato, ser porta estandarte – estamos nessa ala; de um utopus consistente, coerente – Queremos fazer parte do “movimento de idéias , por as idéias em movimento†(manifesto editorial ‘ENSAIO’) – Por isso que este projeto, nem deveria, nem poderia ser somente musical, mas sim a confluência - o cruzamento de proposituras e premissas – de posições devidamente circunscritas para o desenvolvimento de uma “po-ética†– e por seu turno, é altamente compromissada com seu gen.
“É certo que a arma da crÃtica não
pode substituir a crÃtica das armas,
que o poder material tem que ser
derrocado pelo poder material,
mas também a teoria se transforma em poder material
logo que se apodera das massas.
A teoria é capaz de se apoderar das massas
quando argumenta e demonstra ad hominem,
e argumenta e demonstra ad hominem quando se torna radical;
ser radical é tomar as coisas pela raiz.
Mas a raiz, para o homem, é o próprio homem.â€
(Marx, CrÃtica da Filosofia do Direito de Hegel)
E de ser movido, ser músico e de acreditar e defender piamente a primazia da música frente as demais expressões formais, acreditamos mesmo que...
“... a melodia, imitando as inflexões da voz, exprime as lamentações, os gritos de dor ou de alegria, as ameaças, os gemidos. Devem-se-lhe todos os sinais vocais das paixões. Imita as inflexões das lÃnguas e os torneios, ligados – em cada idioma – a certos impulsos da alma. Não só imita como fala, e sua linguagem, inarticulada mas viva, ardente e apaixonada, possui cem vezes mais energia do que a própria palavra. Disso provém a força das imitações musicais, e nisso reside o império do canto sobre os corações sensÃveis.â€
(Ensaio sobre a Origem das LÃnguas, Rousseau)
“Todos, ao ouvirem música, ou imitações, são arrastados ao estado de alma correspondente (...) os ritmos e melodias contém representações e imitações da ira e da doçura, da força e da temperança e de todas as demais qualidades morais, imitações estas que com o maior vigor correspondem à verdadeira natureza destas qualidades – os fatos o evidenciam: ao ouvir estas imitações, sentimos mudar nossa alma.â€
(Poética, Aristóteles)
E este manifesto que não se propõe a ser a moda da verborragia convencional, mas sim, efusivamente apenas um breve conjunto aforismático – cumpre bem o papel a que se propõe – que é o de tornar o manifesto feito - com as nossas proposituras e moções – a nossa posição.
“A humanistas, o estudo apaixonado da substância humana do homem, penetra na essência de toda literatura, de toda arte verdadeira; por isto, a arte e a literatura autênticas são humanistas, não só por expressarem apaixonadamente o homem, a verdadeira essência de sua natureza, mas também por defenderem apaixonadamente a integridade do homem contra as tendências que a atacam, envilecem e adulteram. Grandeza artÃstica, realismo autêntico e humanismo estão indissoluvelmente unidos.â€
(Lukács)