Arte no Escuro
Reminiscências de uma BrasÃlia perdida no tempo...Marco inicial do gótico nacional, o ano de 1985 viu os primeiros registros de bandas como o Muzak, de São Paulo, além de fazer da cidade de BrasÃlia uma incubadora de bandas que, além beber das fontes pós-punks inglesas, assimilavam o estilo e a atmosfera sonora de bandas como Cocteau Twins, Bauhaus e Joy Division.
Antes disso, influências do gótico inglês eram notáveis até mesmo em bandas "comerciais" como RPM, mas sempre havia um atenuador, como o contraponto eletrônico ou, no underground, a adição de sonoridades nacionais (vide o experimentalismo de bandas como Black Future, Chance e Fellini).
Então, o que diferenciava a primeira leva pós-punk daquela safra pós-85? Naquele ano, por exemplo, o Finis Africae tocava "Kick in the Eye" num de seus shows e a apresentava como uma canção de "um conjunto de punks góticos ingleses, o Bauhaus". Se São Paulo tinha as galerias de lojas importadoras de discos, BrasÃlia, igualmente privilegiada, tinha nos filhos dos diplomatas pequenos e eficientes focos de difusão cultural. Não espanta, portanto, o grau de acuracidade com que uma banda como o Bauhaus é citada ao vivo. Havia informações abundantes; além disso, havia muita vontade de produzir algo afim, sendo a banda 5 Generais o exemplo cabal da emulação sonora de então.
Tais bandas não eram casos isolados de uma subcultura limitada a "ilhas" urbanas. Havia intenso diálogo, o que se comprova por uma filipeta que naquele ano divulgava justamente uma apresentação com as bandas Finis Africae, Detrito Federal, 5 Generais, A+ e… Arte no Escuro. Quanto à última, que naquela apresentação estreava muitÃssimo bem acompanhada, podemos afirmar que sua trajetória configura um "passo além" rumo a uma sonoridade que não mais se via como herdeira de tradições brasileiras, mas como uma legÃtima encarnação pós-punk, de cariz gótico e intimista.
Fundada naquele mesmo ano, a banda contava com Lui (voz), Pedro Hiena (baixo e letras), Adriano LÃvio (bateria) e Paulo Coelho (guitarra). Já em sua primeira apresentação, a banda protagoniza cenas que serviriam de prólogo à sua lenda: ao cantar "Beije-me Callboy", canção sobre o submundo brasiliense com cenas de prostituição e suicÃdio, o vocalista Lui despeja um recipiente de tinta negra sobre si, num happening até hoje comentado pelos presentes. Musicalmente, a banda já iniciava com uma maturidade invejável, mas os anos seguintes provariam que havia muito ainda a realizar.
Poucos meses após a primeira apresentação, o vocalista Lui deixa a banda e dá lugar à jovem Marielle Loyola, então recém-saÃda da Escola de Escândalo, onde fazia os vocais de suporte. O talento, a presença e o estilo da nova vocalista serviram como um enorme diferencial naquele momento de efervescência musical, e as rádios passaram a executar algumas faixas da fita de demonstração da banda, como "Beije-me Callboy" e "Na Noite". Em 1987, o Arte no Escuro foi contratado pela EMI e o álbum intitulado Arte no Escuro (1988) seria lançado poucos meses depois, com evidentes amostras do impacto musical e do apelo visual da banda. Ironicamente, comenta-se (no livro Dias de Luta, por exemplo) que a Escola de Escândalo, banda que expulsara Marielle, foi preterida pela gravadora, que preferiu apostar justamente em sua nova e instigante banda.
Após o lançamento do LP, Marielle funda a banda Volkana, de Thrash Metal, mudando-se para São Paulo. O Arte no Escuro então encontra sua dissolução e seu único lançamento de mercado torna-se cada vez mais cobiçado pelos colecionadores. O contrato com a gravadora, aliás, expirou em 2004, o que deixa o trabalho disponÃvel para negociação por outros selos. Uma eventual edição em CD não só serviria para recompor o quebra-cabeça da história do rock nacional, como também daria algo palpável à s legiões de novos apreciadores da banda, que se lamentam de só disporem de arquivos digitais, sem algo mais "palpável". Em CD, a banda teve apenas uma canção lançada ("Beije-me Cowboy"), incluÃda por Charles Gavin (Titãs) na compilação Discoteca Básica: Pop Rock Nacional dos Anos 80, o que é bom, mas ainda é muito pouco.
Atualmente, Marielle se dedica à banda Cores D Flores e Pedro vive em Londres, enquanto os demais ex-integrantes parecem ter abandonado a música.
Texto extraÃdo da Revista Carcasse .
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